André Gonzales
“A liberdade se encontra nos limites. Trabalho com essa crença. Se não entendo o que me limita não consigo transpor o que me impede de criar. E transpor os limites não quer dizer desfazê-los, transpor na verdade é reinventá-los.
Tudo tem um limite. O corpo. A palavra. A vida. A existência depende de contornos. Por isso, para mim, a criação é esse jogo de delimitar novos contornos para os já existentes. Transbordar as bordas para definir um novo espaço. Ressignificar os signos. Reinventar a própria existência.
O limite é a base da criação. É a matéria-prima. Afinal, é preciso existir a palavra para existir a metáfora. É preciso a forma para a composição. É preciso a nota para a melodia. É preciso o indivíduo para o coletivo.
Não importa se é na música, no design, na palavra, em um vídeo, em uma interação ou em uma ideia, sempre parto daquilo que me limita. Me entender limitado é me instrumentalizar com as infinitas possibilidades de realizar.
Na música, meu primeiro limite sempre costuma ser a melodia. No Móveis [Coloniais de Acaju, banda brasiliense da qual é vocalista] normalmente criamos a letra depois que a melodia já está definida. Na melodia é possível entender uma intenção, às vezes, até um enredo. De seus intervalos harmônicos, seu tom, seu ritmo, é possível perceber tristeza, alegria, vontade. Além disso, cada melodia me dá uma quantidade de sílabas definida. É primeiro um processo sensorial, de sentir o que a melodia fala para definir um tema, e só num segundo momento, realizar um trabalho mais cognitivo de contar as sílabas, ver que palavra cabe em que lugar, quais os acentos e rimas possíveis. Tudo sem perder a intenção do que se sente com a canção: melodia, métrica, palavra e metáfora.
Para além da música, da arte, da palavra, a própria vida é um limite possível de ser ressignificado. E do meu trabalho eu vejo a possibilidade de fazer dessa vida minha própria metáfora.”
André Gonzales
Músico, designer e artista performático. Formou-se em Desenho Industrial pela UnB e é vocalista e compositor da banda Móveis Coloniais de Acaju desde que cursa o Ensino Médio (1998). Recentemente liderou um bloco de carnaval em Brasília, o Bloco do Amor, que ele acredita também ter sido construído a partir de limites.